v. 4 n. 8 (2021): Veredas - Revista Interdisciplinar de Humanidades

Nesta quadra da história, quando nos encontramos sitiados pela escuridão, intolerância e blasfêmia negacionistas, precisamos recordar da força de Goethe que, mesmo em seu leito de morte, não se deixou capitular e pediu: “Lich, mehr licht” (“Luzmais luz”).

A nós, que, felizmente, escapamos do flagelo da ignorância, só nos resta resistir, professando fé inabalável nos saberes acumulados pela ciência, com a convicção de que, à maneira de Diógenes, devemos seguir, iluminando os espaços escuros por onde passarmos. E, de passagem, entregamos aos nossos leitores mais um número deVeredas.

Os tempos são sombrios, mas não podemos perder a esperança no Brasil e nos brasileiros. O momento nos pede um pouco de mais paciência, a paciência requerida pelo pesquisador em seu ofício. A alma adoentada clama pela cura do mal, a pressa nos pede um pouco mais de calma para escutar e processar opiniões divergentes, que norteiam o fazer editorial de Veredas.

No cenário multicultural e interdisciplinar desta revista, o erudito e o popular se entrelaçam, conferindo sentido ao canto otimista de Lenine e Dudu Falcão em sua ode à Paciência:

Mesmo quando tudo pede
Um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede
Um pouco mais de alma
A vida não para

[...] Enquanto todo mundo
Espera a cura do mal
E a loucura finge
Que isso tudo é normal
Eu finjo ter paciência

O mundo vai girando
Cada vez mais veloz
A gente espera do mundo
E o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência

[...] Será que é tempo
Que lhe falta pra perceber?
Será que temos esse tempo
Pra perder?
A vida é tão rara
Tão rara [...]

Tão rara é a vida! E Veredas busca fugir do cerco obscurantista imposto ao povo e às universidades brasileiras, abrindo-se às contribuições de pesquisas variadas, que procuram responder à contingências sociais e à preocupações acadêmicas sobre a marcha do conhecimento. O primeiro artigo, de Renata Pitombo Cidreira e Etevaldo Santos Cruz, da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) em “Corpo, Veste e Afeto”, analisa as dimensões afetivas do corpo, espelhando a entrada das emoções como um objeto recente e inovador de pesquisa.

A seguir, o pluralismo dos olhares se detém sobre a ecologia, relembrando a exigência atual da defesa do meio ambiente, para a preservação da vida na Terra. “Políticas verdes e a formação de partidos ecológicos em Portugal”, de Antônio Teixeira Barros apresenta-nos uma reflexão sobre a responsabilidade política do homem para controlar o uso da Natureza, com ética e pragmatismo.

A lógica da escrita e as possibilidades formativas no encontro do popular com o erudito nas ciências humanas encontram-se analisadas em “Leitura e escrita na alfabetização acadêmica”, de José Douglas Alves dos Santos, Éverton Vasconcelos de Almeida e Marizete Lucini.

A família e a igreja, como instituições mais antigas e universalizadas de nossa espécie, é discutida em “O papel da família na educação sexual: discursos pastorais da Igreja Católica”, com o destaque concedido por Cícero Edinaldo dos Santos às interfaces entre Igreja Católica, família e educação sexual no mundo contemporâneo.

As preocupações com as políticas públicas de saúde e cuidados com o corpo apresentam-se em “Causas do absenteísmo dos Usuários em Consultas Odontológicas”, de Alberto Boaventura da Conceição Junior e Chennyfer Dobbins Abi Rached. As emoções, como objetos recentes de pesquisa, reaparecem, concentradas, desta vez, em “Modelo conceitual para análise do Design Emocional”, de Manuela Gortz-Bonaldo, Décio Estevão do Nascimento e Frédéric Huet.

“Princípios éticos para pesquisas com seres humanos em Ensino de Ciências e Saúde” são discutidos por Nielce Meneguelo Lobo da Costa, Susana Nogueira Diniz e Carlos Alexandre Felício Brito em “Conhecimentos prévios sobre a ética nas pesquisas com seres humanos”, artigo que discute as barreiras entre a necessidade do saber e o respeito ao conceito do ser humano como sujeito de direito.

Memória e arquivos aparecem em “Fotografia como fonte histórica”, de Carlos Bauer, Lucilene Schunck C. Pisaneschi e Viviane Freitas. Os autores fazem o alerta de que as imagens podem valer ou não por mil palavras com seus registros e recortes das visões do mundo, sejam elas reais ou fictícias.

Em “Escrita gestual do corpo”, Helry Costa da Silva e Juliane Vargas Welter, analisam o elemento erótico na novela “O erotismo em um copo de cólera, de Raduan Nassar. Os autores são guiados, em suas investigações, por David Le Breton (2009) e Octavio Paz, que oferecem pistas e metodologias distintas, mas complementares, para compreender as relações entre o amor, o   erotismo e a sexualidade a partir das ações e gestos manifestos pelos personagens em cena.

Os problemas sobre a formação da esquerda revolucionária brasileira são tratados por Alzira Lobo de Arruda Campos, Rafael Lopes de Sousa e Manoel Francisco Guaranha em “Sistema repressivo e aparelhamento do Estado na década de 1930”, com o uso de farta documentação produzida pelos próprios revolucionários ou pelos policiais.

Por fim, esta edição apresenta ao público leitor quatro resumos de dissertações e teses de diferentes universidades do Brasil. O primeiro da mestra Patrícia Vieira Santos, expõe resultados da pesquisa sobre as “Estratégias pedagógicas para graduação pública tecnológica”. Na sequencia temos o resumo da dissertação de Rodrigo Nazário Gerônimo Pinto. Trata-se de uma análise crítica sobre o direito do consumidor e as tendências da comunicação na cultura pós-moderna e a hipervulnerabilidade que atinge os consumidores na era da cibercultura.

O corpo editorial de Veredas espera que o material desta edição sirva para fomentar o debate sobre o papel das Ciência, em especial das “Humanas”, para a formação de um pensamento crítico, capaz de contribuir para levantar problemas e apresentar soluções relativa ao tempo presente, à espera de um futuro mais auspicioso. Anseia, ademais, que os olhares polissêmicos que Veredas apresenta sobre a cultura e os costumes do Brasil transmitam um pouco da paisagem acadêmica destes tempos nefastos de pandemia.

A todos, uma boa leitura e uma boa sorte!

Rafael Lopes de Sousa           

Editor de Veredas

Publicado: 2021-11-26

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